terça-feira, 19 de fevereiro de 2008

A carreira profissional na roda dos expostos

Acho que todos nós conhecemos exemplos na vida econômico-profissional de pessoas que começaram no nada e amealharam grande riqueza. Isso me faz lembrar do Visconde de Mauá e Abraham Lincoln. Se não foram ricos, não se conformaram com sua condição social e avançaram. Eles não desistiram nunca, e se tornaram célebres pelo que fizeram.

Embora cada um haja seguido uma área e tocado sua vida de uma forma, noto uma coisa: todos tocaram os estudos adiante e buscaram o mercado de trabalho. Seja como for, tiveram uma oportunidade e seguiram adiante. Isso os colocou em patamares de merecido respeito, tornando-se alvo de todos que queriam (e ainda querem) a excelência.

É interessante notar o tino comercial de Irineu e a dedicação de Lincoln. Contudo, pouco adiantaria se apenas fossem preparados, sem aplicarem fora da socrática caverna tudo o que eles aprenderam.

E aqui toco no fulcro da questão: quantos dos nossos jovens têm oportunidade de começar uma carreira de trabalho? Isso não é uma justificativa para o crime, mas não se aceita gari sem Ensino Fundamental! Há que se mostrar diploma para varrer calçada! É necessário?

Acho que estamos impregnando uma cultura de almofadinhas; enquanto isso, o mercado segue de mal a pior. Nem office-boy se contrata hoje em dia. Agora, é boy terceirizado, que não tem nenhum vínculo com empresa, não conhece patrão e nem deve satisfação a ninguém.

O mercado de trabalho trata seus elementos de maneira tão descartável quanto os copos de plástico do final de festa que fazemos nos escritórios (porque, se for em casa, é capaz da mãe juntar, lavar e usar de novo).

Posso ser muito romântico, mas me é marcada a impressão de que, outrora, as pessoas eram chefiadas por pessoas; muitos, bem novos e com necessidades financeiras, procuravam serviço e, às vezes, eram confiados pelos pais para ficarem sob os auspícios de senhores austeros, que davam uma formação de caráter e ainda permitia progredir na empresa, conforme o mérito. Se fossem endinheirados, os jovenzinhos talvez se dedicassem mais às artes e letras, mas sabiam que precisariam fazer alguma coisa: nem a família real passa o dia à base de aluá e pão de milho!

Olho por mim: com um calendário escolar regular, formar-me-ia no Ensino Médio com 16 anos! De que eu poderia trabalhar? De entregador de lanches? Nada contra, mas todos sabem que se pode lutar por outras áreas que permitam crescer; contudo, a formação de um adolescente, em geral é toda idêntica, não aponta virtudes nem objetivos.

Quem tem dinheiro, aprende, e isso é inegável. Quem pode estagiar pelo prazer de peticionar ou para agregar conhecimentos, pode aplaudir aos céus pela formação que se vai consolidando. E quem não pode?

Nessas horas, penso nos colegas que, para manter a faculdade, fazem qualquer coisa para conseguir seus carcarás minguados: de garota de programa a auxiliar de serviços gerais, todas as carreiras se encontram na Academia visando sustentar os futuros operadores do Direito. É triste, mas se nota o contraste dos colegas de rosto bem escanhoado, metidos nos ternos de corte impecável, e aqueles que usam simulacros de calças e camisas, que chegam a ser rotas, tudo para, fazendo empenho de mostrar boa apresentação, honrar a nobre carreira jurídica.

O mundo dos negócios é voraz, e traga a todos sem nenhum pingo de bondade. Contudo, houve o tempo dos senhores bonachões e das matronas – proprietários e/ou gerentes de armarinhos, perfumarias, panifícios, escritórios e até bancos – que oportunizavam ao jovem a inserção nesse mundo de ai-meu-Deus. Hoje, você é apenas uma nota. “Ah, não estudou isso ainda? Desculpe-me, não me serve.” E a roda dos expostos gira, e a Mãe Gentil, que se fia por tutora desses profissionais ainda não inseridos, não consegue mais sustentar esse sistema que não quer a continuidade da sociedade, mas o continuísmo dos maus paradigmas de uma sociedade que não se dispõe a crescer de maneira democrática (não se leia “demagógica” ou “populista”).

“... aquele que for incapaz de viver em sociedade, ou que não tiver necessidade disso por ser auto-suficiente, será uma besta ou um deus, não uma parte do Estado. [...] ... se o homem não for excelente, será o mais perverso e selvagem dos animais, o mais repleto de luxúria e de gula. Mas a justiça é o vínculo dos homens, nos Estados; porque a administração da justiça, que é a determinação daquilo que é justo, é o princípio da ordem numa sociedade política”. (Platão, A Política)

Saúde, força e união!

Nenhum comentário: